Ele consegue voar
Acabo de sair da sessão de Superman Returns. Tirando todo o - tradicional - delírio de fanboy, o filme foi particularmente rico não em coisas novas, mas repetições e lugares-comuns.
E isso é particularmente mágico.
A coisa que mais me fascina na personagem do Super-homem é como ele representa tudo aquilo que não é politicamente correto atualmente. Ele não é representante de uma etnia minoritária, não é descendente de imigrantes, não fala o meu idioma ou tenta fazer parte de uma aldeia global, ele não tem depressão ou desvios existenciais particulares da humanidade. Ele não sai de casa com a cara pintada pra protestar contra o que acredita. Ainda assim, é o maior certinho da história da cultura pop. E todo mundo sabe que o politicamente correto odeia os certinhos, eles são aberrações do sistema, falhas na matrix.
Além disso tudo, ele representa uma entidade anacrônica, meio homem meio deus, quase onipotente. E sua onipotência é uma ameaça pra humanidade, pois diante dela o homem vê sua pequenez diante de todo o resto do mundo. Não bastando isso, ele ainda se veste de humano. Se veste de frágil. Em vez de assumir logo seu trono por direito - ou melhor, por força bruta que enseja o direito - ele opta por viver seu caso diário de aparente displicência e desfaçatez.
E talvez o mais absurdo seja sua inocência. Ele crê na bondade, nas pessoas, na política, na família, nos amigos, na vida. Pobre diabo, ninguém avisou que o mundo está assolado por batráquios e verminosos querendo sugar seu sangue de qualquer forma possível. Mal sabe ele que o mundo todo está configurado em um plano pra pegá-lo numa arapuca, uma verdadeira sinuca de bico.
Então, ele é inocente, idealista, ilimitado e ordeiro. Não existe coisa mais demodé, mais retrógrada, mais fora do tempo, mais caxias, mais medíocre, mais mesmice. Super-homem hoje devia cuidar da casa, advogar os direitos das mulheres, ser árabe ou chinês, ser GLS e ainda ler Fante e ter O Vagabundo Iluminado na cabeceira.
E eu aqui querendo um dia ter um filho e ensinar o garoto a não mentir, tratar bem a todos e não desistir. Não sei se o super-homem serei eu ou será ele...
ps: welcome back, starman ...
ps: welcome back, starman ...
2 Comments:
Muito muito bom texto.
Mas não, eu não acredito no super homem, se tivéssemos de supor uma existência de alguém que tem todos os poderes que ele tem e ainda opta por viver do jeito que ele vive. Só podia não ser humano mesmo.
É, sou cética demais, sonhadora de menos. Que triste.
faça o caminho do silogismo vc mesmo, no final:
superman é jesus!!!
que horror(?), eu ainda acredito...
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