quinta-feira, junho 29, 2006

Fascinação


A quarta-feira de hoje - na verdade enquanto escrevo isso o mais correto seria dizer ontem - foi um dia anômalo, especialmente no Brasil. Após maratonas de três jogos diários em horários diferentes, quatro jogos agrupados em dois horários, hoje/ontem não tivemos jogo algum, assim como também não teremos nesta quinta-feira. Sexta a festa recomeça, mas só esses dois dias de vácuo já soam estranho após toda essa maratona e já dão uma dica de como vai ser quando a copa acabar, em pouco mais de uma semana. Essa pausa até foi boa pra mim, assisti ao menos 5 minutos de quase todos os jogos da copa, nem que fosse em trânsito ou acompanhando pela internet. Cheguei ao cúmulo de ver o segundo jogo da alemanha pelo reflexo em uma vidraça, espiando a televisão do reitor da Faculdade Câmara Cascudo, enquanto em reunião com o pessoal do Marketing. Quinta-feira, para os transeuntes desinformados, é o Sacro Dia da Faxina, na minha casa. Minha mãe me tira da cama às 7 nem que seja só pra se certificar de que eu não estou descansando no Sacro Dia da Faxina, pois, como todo mundo sabe, é pecado. Logo, eu precisaria correr o mais longe possível de casa, pra evitar o temperamento cataclísmico que enche a casa e arredores. Doravante, tornaria a minha vida de ávido consumidor futebolístico ligeiramente mais difícil. Felizmente existe a pausa, então, e cada um aproveita como pode. Juninho Pernambucano treina com os (e as) demais reservas na foto acima. Nós de cá padecemos de uma espécie de Síndrome de Deficiência Futebolística. Ninguém no jornal comentando uma arbitragem tosca (por sinal, viram que o cara que lascou a austrália vai apitar o BrasilxFrança?) , inúmeros replays e tudo mais.
Empreguei esse tempo de reflexão pra adiantar algumas leituras, ir ao oftamologista (que me confirmou o esperado, estou ficando gradativamente mais cego e uma boa estratégia pra impedir esse fenômeno é usar DE VERDADE o óculos), entre outras coisas banais. Estou relendo O Mundo de Sofia, de Jostein Gaardner. Li pela primeira vez as aventuras de Sofia Amundsen quando tinha uns quinze ou dezesseis anos, acho, o livro ficou emprestado por uns três anos - pessoas que ainda não devolveram meus livros, captem as indiretas - e só mês passado voltou aqui pra casa. Incrível como passado esse curto tempo, parece que tudo mudou, somos velhos conhecidos que mal se falam mas ainda se conhecem muito bem. Fiquei particularmente extasiado pelas lembranças da minha primeira leitura, esta carregada de uma legítima fascinação juvenil, que hoje reservo pra coisas bem particulares como encher cumbucas de gelo ou completar um álbum de figurinhas. Neste sentido, o livro fala muito da necessidade de se cultivar esse sentimento, essa emoção. A surpresa, o prazer hoje tão blasé (juro que sempre quis usar essa palavra, sério mesmo) de se deliciar com as coisas, novas ou não.
Eu sempre fui partidário de David Hume - outro dia escrevo algo sobre minha opinião acerca dele - e concordo com toda a importância sobre saber deixar de lado o passado e a experiência que nos cega frequentemente de saborear novas facetas, habilidade muitas vezes enferrujada pela rotina. Mas se bem que, pensando melhor, não acho que exista ninguém com apatia o suficiente pra não ver na alegria e disposição infantil como essa das filhas do Pernambucano fascinação o suficiente pra servir de combustível durante um longo dia maçante. Citando meu filósofo-pop-favorito mais recente, o Cantona: "Never grow up, children, never grow up".